O Dia Nacional da Consciência Negra, celebrado no dia 20 de novembro, foi Instituído pela Lei n.º 12.519, de 10 de novembro de 2011, a data remete ao dia da morte do líder do Quilombo dos Palmares, Zumbi, no ano de 1695. Como uma forma de participar dessas discussões durante o mês de novembro a Universidade Federal de Roraima (UFRR) vem realizando uma série de ações, atividades e eventos que abordam a temática dentro do cenário do ensino, pesquisa e extensão. Um deles é o I Seminário Negra Geografia que será realizado pelo Departamento de Geografia da UFRR. O evento será realizado nos dias 27 e 28 de novembro no auditório do Hydros/IGEO no campus Paricarana.
Segundo uma das organizadoras do seminário, Emilly Marjury da Silva Cruz, a programação celebra o Dia da Consciência Negra apresentando uma série de discussões. “Pauta as questões que perpassam a negritude e almeja aproximar as reflexões da ciência geográfica às discussões sociais e culturais referentes a população negra. Então os temas trazem a presença negra em Roraima, a organização do movimento negro, racismo e sexismo na produção do espaço, o ensino da cultura afro-brasileira na educação básica e religião”, afirma Emilly. Para se inscrever e obter mais informações, os interessados podem acessar a página oficial do evento.
Outras atividades foram realizadas durante o mês de novembro debatendo as questões que envolvem a temática. Entre os dias 11 e 13 de novembro ocorreu o III Seminário Africanidades e Minorias Sociais do Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGL- UFRR) junto com VIII Congresso Regional Norte-Nordeste da ABRAPLIP. Os eventos ocorreram no campus Paricarana.
Voltado para pesquisadores, professores do ensino superior e da educação básica, alunos de graduação e pós-graduação, a programação dos eventos abordaram temáticas como africanidades, literaturas e minorias sociais, vozes femininas nas literaturas de língua portuguesa, oficinas literárias para professores, entre outras. “A temática desta terceira edição fez referência a eventos históricos sobre a Revolução dos Cravos e a subsequente independência das colônias africanas. Estes fatos direta ou indiretamente influenciaram os rumos das literaturas de língua portuguesa no Brasil. Assim discutimos também pautas sobre letramento racial, racismo estrutural, ensino de literatura africanas”, conta a professora e organizadora do evento, Verônica Prudente.
Outro evento foi o V Colóquio de Relações Étnico Raciais e o Mês da Consciência Negra na UFRR que aconteceu nos dias 4 e 5 de novembro no auditório do Centro de Ciências Humanas. O colóquio discutiu diferentes visões de mundo a partir das leituras dos povos indígenas e afro-brasileiros e promoveu debates sobre a leis 10.639/2003 (que inclui no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira) e 11.645/2008 (que torna obrigatório o ensino da história e cultura afrobrasileira e africana nas escolas públicas e particulares).
Conforme uma das organizadoras do evento, a professora Monalisa Pavonne Oliveira, a busca foi, sobretudo, por destacar as experiências e os desafios de colocar em prática uma educação antirracista e inclusiva na sociedade amazônica e brasileira.
“Neste ano o colóquio buscou a temática ‘Histórias: diferentes formas de contar e ler o mundo’. Contamos com a participação dos alunos, escritores como Josias Marinho e Sony Ferseck, a cantora e compositora Euterpe, a exibição do documentário Orí sobre a trajetória de Beatriz Nascimento, historiadora e militante no movimento negro. Parte interessante foi a participação de lideranças afro-religiosas reunindo sacerdotes e sacerdotisas, praticantes da umbanda, candomblé, jurema sagrada e terecô. Nossa busca foi contribuir para divulgação de uma educação antirracista, buscando desconstruir preconceitos e criar um ambiente de tolerância, paz e de construção de conhecimento”, afirma a professora.
Educação para combater o racismo e trabalho em prol da causa
Além da série de atividades acadêmicas e eventos, é preciso destacar uma das personagens proeminentes da luta pela causa dentro da UFRR que é a estudante do curso de História, Letícia Barbosa. Com um trabalho de pesquisa voltado para as áreas da educação antirracista e africanidades, Letícia possui uma história de vida envolvida diretamente dentro da temática uma vez que a estudante é figura presente dentro do movimento estudantil, foi a primeira estudante negra a presidir o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFRR entre 2022 e 2023. Além disso, foi presidente do Centro Acadêmico de História e possui atuação direta se envolvendo com outras entidades estudantis e civis que tratam do assunto.
Na parte acadêmica, Letícia é membro dos grupos de pesquisa: Africanidades, Literaturas e Minorias Sociais (UFRR) e História, Educação e Interculturalidade no Contexto Migratório de Roraima (UFRR). “Minha história com a militância começou em 2020 na universidade. Assim que entrei já fui me engajando no movimento estudantil e me deparei com uma série de questões sociais. Muitos espaços me foram oportunizados por causa desse trabalho e desde então tenho participado ativamente em um caminho sem volta. Um deles foi que participei como parte do DCE da construção do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial em Roraima ano passado”, afirma a estudante.
Neste ano a estudante foi uma das representantes da universidade e do estado no edital da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) chamado de “Caminhos Amefricanos: Programas de Intercâmbios Sul-Sul”. O edital é promovido por meio de uma parceria com o Ministério da Igualdade Racial (MIR) buscando promover intercâmbios para fortalecer uma educação antirracista através da troca de experiências, conhecimentos e políticas públicas em países do Sul Global para docentes e discentes de licenciatura.
Conforme a Capes, a seleção contou com 980 inscritos sendo “direcionada para estudantes quilombolas ou autodeclarados pretos ou pardos, estudantes de licenciaturas a partir do 5º semestre e vinculados a Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros (Neabs), Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabis) ou grupos correlatos”.
A bolsa ofereceu uma estadia de 15 dias junto a Universidade Pedagógica de Maputo em Moçambique com uma bolsa voltada à formação de professor antirracista. Para Letícia, a experiência significou um retorno importante a ancestralidade.
“Passar alguns dias no continente-mãe significou um grande salto em minha formação enquanto professora antirracista e em minha trajetória de vida. Como disse outra intercambista, foram 15 dias vivendo sem os atravessamentos do racismo estrutural, 15 dias me sentindo mais bonita, mais inteligente, e mais importante para o mundo. Tenho certeza que todos os 50 intercambistas dos diversos cursos de licenciatura das universidades públicas brasileiras tiveram suas vidas e formações transformadas pela vivência moçambicana”, analisa Letícia.
A estudante da UFRR ainda destaca que este tipo de investimento é fundamental na formação do professor. “Importante o desenvolvimento da Educação Antirracista a partir de um ponto chave, a formação do professor. Meu desejo é que o “Caminhos Amefricanos” se amplie e tenha vida longa, e que as universidades também se envolvam com a divulgação e apoio a este programa federal. Para mim foi o reconhecimento de um trabalho para além do âmbito acadêmico que foi valioso. Toda a minha trajetória de certa forma me relaciona a temática da promoção da igualdade racial, ações afirmativas, educação antirracista”, observa ainda.
Como uma estudante de história, sobre as questões que envolvem a luta pela igualdade e o racismo no Brasil e na Amazônia, Letícia ainda destaca o contexto histórico que envolveu a formação do país e a luta por mais políticas de inclusão do negro roraimense.
“Após a abolição da escravidão não foi elaborado nenhuma política de inclusão e integração do negro na sociedade brasileira em qualquer perspectiva, muito pelo contrário, ele foi afastado, colocado a margem e isso corroborou para que ainda estejamos lidando com o racismo estrutural de forma muito presente. Creio que a educação é um dos melhores meios para o combate ao racismo. Em Roraima, precisamos ser mais incisivos na questão da implementação das políticas públicas de mais inclusão da juventude negra periférica, de incentivo a formação superior e educação, acesso, ingresso e principalmente permanência dentro da universidade”, avalia.
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