Publicado em: 9 de outubro de 2024
Atualizado em: 18 de novembro de 2024
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A saúde indígena é um universo à parte, que exige um olhar cuidadoso e despido de preconceitos. Ao tratar desse tema, é comum encontrarmos barreiras que se contrapõem às nossas concepções morais, por isso é fundamental nos desapegar de conceitos pré-moldados e estar dispostos a compreender as particularidades desse tema. A saúde indígena se manifesta de formas diversas nos diferentes espaços regionais do Brasil, assim como a cultura, as práticas de cuidado e as necessidades de saúde variam entre as comunidades indígenas.

Cada comunidade possui sua própria história, cultura e relação com o sistema de saúde. Portanto, ao discutir políticas ou intervenções voltadas para a saúde indígena, é essencial considerar esses aspectos singulares. A interseccionalidade, por exemplo, é uma ferramenta fundamental para esse diálogo, pois as condições de saúde e o acesso aos serviços são impactados por múltiplos fatores, como gênero, classe, etnia e territorialidade. Esse olhar permite entender os desafios e as dificuldades enfrentadas pelas populações indígenas.

Além disso, é crucial lembrar que a promoção da saúde indígena deve ser construída em conjunto com as próprias comunidades. Elas não devem ser vistas como meras beneficiárias, mas sim como protagonistas na criação de soluções que respeitem suas identidades e necessidades. Essa abordagem não apenas enriquece as práticas de saúde, como também contribui para um sistema mais justo, equitativo e respeitoso quanto à diversidade cultural.

O caráter diverso e complexo da saúde indígena foi reconhecido no capítulo V da Lei 8.080/1990, com a criação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena. Esse subsistema deve ser diferenciado, seguindo os princípios de equidade, integralidade e universalidade que orientam o Sistema Único de Saúde (SUS). Ele é descentralizado, hierarquizado e regionalizado, sendo implementado por meio dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs).

Desde 2010, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) do Ministério da Saúde coordena esse atendimento. São mais de 751 mil indígenas aldeados em todo o país, atendidos por uma equipe de mais de 20 mil trabalhadores, entre os quais muitos são indígenas. A Sesai promove a atenção primária à saúde de forma participativa, respeitando as especificidades epidemiológicas e socioculturais desses povos.

A criação do Subsistema de Saúde Indígena, oficializada pela Lei Arouca em 1999, e a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (Pnaspi), de 2002, reforçam a necessidade de um modelo de atenção diferenciado e complementar. Esse modelo é executado de forma descentralizada pelos 34 DSEIs, garantindo o acesso universal e integral à saúde, conforme os direitos preconizados pelo SUS. As comunidades indígenas são envolvidas no planejamento e execução das políticas de saúde, assegurando o pleno exercício de sua cidadania.

Tal Subssistema deve ser descentralizado, hierarquizado e regionalizado e é orquestrado através dos Distritos Sanitários Especiais Indígena (DSEIs)

leia aqui um trecho da Lei 8080 de 1990

Art. 19-A. As ações e serviços de saúde voltados para o atendimento das populações indígenas, em todo o território nacional, coletiva ou individualmente, obedecerão ao disposto nesta Lei.

Art. 19-B. É instituído um Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, componente do Sistema Único de Saúde – SUS, criado e definido por esta Lei, e pela Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, com o qual funcionará em perfeita integração.

Art. 19-C. Caberá à União, com seus recursos próprios, financiar o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena.

Art. 19-D. O SUS promoverá a articulação do Subsistema instituído por esta Lei com os órgãos responsáveis pela Política Indígena do País.

Art. 19-E. Os Estados, Municípios, outras instituições governamentais e não-governamentais poderão atuar complementarmente no custeio e execução das ações.

§ 1º A União instituirá mecanismo de financiamento específico para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, sempre que houver necessidade de atenção secundária e terciária fora dos territórios indígenas.

§ 2º Em situações emergenciais e de calamidade pública:

I – a União deverá assegurar aporte adicional de recursos não previstos nos planos de saúde dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (Dseis) ao Subsistema de Atenção à Saúde Indígena;

II – deverá ser garantida a inclusão dos povos indígenas nos planos emergenciais para atendimento dos pacientes graves das Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde, explicitados os fluxos e as referências para o atendimento em tempo oportuno.

Art. 19-F. Dever-se-á obrigatoriamente levar em consideração a realidade local e as especificidades da cultura dos povos indígenas e o modelo a ser adotado para a atenção à saúde indígena, que se deve pautar por uma abordagem diferenciada e global, contemplando os aspectos de assistência à saúde, saneamento básico, nutrição, habitação, meio ambiente, demarcação de terras, educação sanitária e integração institucional.

Art. 19-G. O Subsistema de Atenção à Saúde Indígena deverá ser, como o SUS, descentralizado, hierarquizado e regionalizado.

§ 1º O Subsistema de que trata o caput deste artigo terá como base os Distritos Sanitários Especiais Indígenas.

§ 1º-A. A rede do SUS deverá obrigatoriamente fazer o registro e a notificação da declaração de raça ou cor, garantindo a identificação de todos os indígenas atendidos nos sistemas públicos de saúde.

§ 1º-B. A União deverá integrar os sistemas de informação da rede do SUS com os dados do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena.

§ 2º O SUS servirá de retaguarda e referência ao Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, devendo, para isso, ocorrer adaptações na estrutura e organização do SUS nas regiões onde residem as populações indígenas, para propiciar essa integração e o atendimento necessário em todos os níveis, sem discriminações.

§ 3º As populações indígenas devem ter acesso garantido ao SUS, em âmbito local, regional e de centros especializados, de acordo com suas necessidades, compreendendo a atenção primária, secundária e terciária à saúde.

Art. 19-H. As populações indígenas terão direito a participar dos organismos colegiados de formulação, acompanhamento e avaliação das políticas de saúde, tais como o Conselho Nacional de Saúde e os Conselhos Estaduais e Municipais de Saúde, quando for o caso.

A Secretaria Especial de Saúde Indígena – SESAI – área do Ministério da Saúde foi criada para coordenar e executar a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas e todo o processo de gestão do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASISUS), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) em todo o território nacional. Seu surgimento em 2010, originou-se da necessidade de reformulação da gestão da saúde indígena no país, demanda essa reivindicada pelos próprios indígenas durante as Conferências Nacionais de Saúde Indígena.

A SESAI tem como missão principal a proteção, a promoção e a recuperação da saúde dos povos indígenas e exercer a gestão de saúde indígena, bem como orientar o desenvolvimento das ações de atenção integral e da educação em saúde segundo as peculiaridades, o perfil epidemiológico e a condição sanitária de cada Distrito Sanitário Especial Indígena – DSEI em consonância com as políticas e programas do Sistema Único de Saúde – SUS. Conheça o Panorama Epidemiológico de Roraima aqui.

Organograma simplificado da Organização Nacional da Saúde Indígena no Brasil

Fonte: SESAI

Existem no Brasil 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas DSEIs). Esses Distritos são unidades gestoras descentralizadas operacionais do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS) com autonomia administrativa e são responsáveis por garantir a prestação de serviços de saúde nas terras indígenas. Cada DSEI cobre uma área geográfica específica e abrange várias aldeias, levando em conta as características regionais e as demandas de cada população indígena. Eles não obedecem limites geográficos convencionais. Na verdade levam em consideração a local e as especificidades da cultura dos povos indígenas. O modelo a ser adotado para a atenção à saúde indígena, que se deve pautar por uma abordagem diferenciada e global, contemplando:

  • aspectos de assistência à saúde
  • saneamento básico
  • nutrição
  • habitação
  • meio ambiente
  • demarcação de terras
  • educação sanitária
  • integração institucional

As equipes de saúde são compostas por médicos, enfermeiros, agentes indígenas de saúde, entre outros profissionais que atuam diretamente nos Territórios Indígenas.

Em Roraima existem dois DSEIs: DSEI Yanomami – que atende os povos Yekuana e Yanomami e DSEI Leste de Roraima – que atende todas as outras etinias indígenas do estado de Roraima (ver a localização geográfica no mapa abaixo). Os primeiros passoa na crição de duas unidades gestoras em Roraima começou ainda em 1993 por ocasião da etapa estadual da II Conferência Nacional de Saúde Indígena. Em 1995 a Assembleia Geral dos Tuxauas aprovou a proposta de criação do DSEI Leste de Roraima, a qual foi ratificada pelo Núcleo Interinstitucional de Saúde Indígena (NISI-RR), e pelas instâncias regionais da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) e Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

Mapa dos DSEIs de Roraima

Fonte: Ministério da Saúde

A estrutura de atendimento nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) é composta por uma rede integrada que abrange postos de saúde, Polos-Base em nível territorial e as Casas de Saúde Indígena (Casais) que servem de retaguarda para o encaminhamento e referenciamento dos indígenas, quando necessário (saiba mais sobre as CASAIs abaixo). Esses serviços formam a espinha dorsal do atendimento à saúde nas áreas indígenas, garantindo o suporte necessário às comunidades.

Nas aldeias, o sistema de saúde é organizado em torno de unidades locais, onde o Agente Indígena de Saúde (AIS) exerce fuções necessárias. Esse profissional, originário da própria comunidade, é responsável por atividades essenciais vinculadas aos postos de saúde, promovendo o acompanhamento contínuo e o fortalecimento das ações de saúde de acordo com as especificidades culturais e epidemiológicas de cada povo indígena. Dessa forma, a estrutura de atendimento nos DSEI se adapta às realidades regionais, promovendo uma assistência que é, ao mesmo tempo, descentralizada e personalizada (ver art. 19-G da lei 9836 de 1999).

Entre as funções dos AIS, encontram-se

  • Acompanhamento de crescimento e desenvolvimento
  • Acompanhamento de gestantes
  • Atendimento aos casos de doenças mais frequentes (infecção respiratória, diarréia, malária)
  • Acompanhamento de pacientes crônicos
  • Primeiros socorros
  • Promoção à saúde e prevenção de doenças de maior prevalência
  • Acompanhamento da vacinação
  • Acompanhar e supervisionar tratamentos de longa duração

ver Sociedade Brasileira de Medicina e Comunidade

A Saúde Indígena, desde a década de 70 sempre foi tema de discussão política com intuito de buscar um modelo que obecesse os princípios de justiça e equidade. Neste período as ações e serviços de Saúde Indígena eram ofertados de modo fragmentado pela Fundação Nacional do Indio – FUNAI,o Governo do Território de Roraima, além da Missão Evangélica da Amazônia (MEVA) e da Igreja Católica através da Diocese de Roraima, e tinha poucos impactos positivos sobre os indicadores de morbi-mortalidade indígenas. O descaso com a Saúde Indígena e a sensação de abandono contribuiu por muitos anos para a difusão de doenças de importância epidemiológica entre os Indígenas. Algumas dessas doenças estão presentes entre os indígenas de Roraima até os dias de hoje. Veja o Panorama Epidemiológico.

A Lei Arouca (Lei 9.836/99) instituiu o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASI-SUS). A partir de então, foram implantados os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) no Brasil. Então o DSEI Leste de Roraima passou a orquestrar as ações de Atenção Básica à Saúde e Sanemento Ambiental para as comunidades indígenas do leste de Roraima por meio de um convênio entre o Conselho Indígena de Roraima (CIR) e a FUNASA.

Entre os anos 2000 a 2008 foi organizada a rede de serviços básicos de saúde nas Terras Indígenas com a implantação dos polos base, postos de saúde, laboratórios de microscopia e a realização de capacitações para Agentes Indígenas de Saúde (AIS), Saúde Bucal, Microscopia e Endemias.

Em 2010 houve a criação da Secreatria Especial de Saúde Indígena – SESAI com incrementos financeiros nos Distritos e a inserção institucional dos programas da saúde indígena na estrutura do Ministério da Saúde. Foi então organizada no DSEI Leste de Roraima a Divisão de Atenção à Saúde Indígena (DIASI) e a implantação das equipes multidisciplinares de saúde indígena (EMSI), com a presença de enfermeiros, odontólogos, médicos, nutricionistas, psicólogos, farmacêuticos e assistentes sociais, entre outros.

De acordo com a portaria nº 1373 de 2017:

III – Polo Base (Território) são subdivisões territoriais do DSEI, sendo base para as EMSI organizarem técnica e administrativamente a atenção à saúde de uma população indígena adscrita.

Os Polos-Base funcionam como o primeiro ponto de referência do fluxo assistencial indígena. Eles podem estar localizados tanto dentro de uma comunidade indígena quanto em um município próximo, onde atuam como uma unidade básica de saúde integrada à rede municipal. Equivalentes às Unidades Básicas de Saúde no contexto da Estratégia de Saúde da Família, os Polos-Base são geridos por uma Equipe Multidisciplinar de Saúde Indígena (EMSI), composta por profissionais como médicos, enfermeiros, dentistas e auxiliares de enfermagem.

Existem dois tipos de Polos-Base, classificados conforme a complexidade dos serviços oferecidos:

Polo-Base I: Localizado em terras indígenas, este tipo de unidade se dedica à capacitação e supervisão de Agentes Indígenas de Saúde (AIS) e auxiliares de enfermagem, coleta de material para exames, esterilização de equipamentos, vacinação de rotina e coleta de dados epidemiológicos. Também realiza atividades de prevenção, como o exame ginecológico para detecção precoce de câncer.

Polo-Base II: Situado em municípios de referência, atua como um ponto de apoio técnico e administrativo para as equipes multidisciplinares. Possui estrutura para armazenamento de medicamentos e materiais, oferece suporte de comunicação via rádio e participa ativamente da organização logística das equipes em áreas indígenas. Além disso, coordena o planejamento de ações de saúde, coleta e análise de dados, e supervisiona o processo de vacinação em sua área de atuação.

Quando a complexidade dos casos excede a capacidade dos Polos-Base, os pacientes são encaminhados para uma rede de atendimento previamente pactuada, que pode incluir desde unidades de saúde especializadas no próprio município até hospitais de maior porte em regiões próximas, dependendo da gravidade do caso. Vale destacar que essa rede de referência recebe um incentivo financeiro diferenciado por meio do Ministério da Saúde, com um financiamento até 30% maior para o atendimento de pacientes indígenas em comparação aos demais.companhamento de pacientes com doenças crônicas, vacinação, coleta de material para exames, cuidados com a saúde infantil, procedimentos curativos básicos e tratamentos básicos em odontologia.

Estabelecimento de saúde integrante do SasiSUS, responsável pelo apoio, pelo acolhimento humanizado e pela assistência aos indígenas referenciados para a realização de ações de atenção especializada e complementares da atenção primária, oferecendo também apoio aos seus acompanhantes. A Casai deve acolher os usuários indígenas em ambientes adequados às especificidades socioculturais, levando em consideração os dispositivos regulamentares de ambiência, de alimentação e de classificação de risco. Deve dispor de ambientes distintos para a realização de assistência em saúde, atividades administrativas, alojamento e apoio técnico e logístico a fim de possibilitar o acesso dos pacientes indígenas à Rede de Atenção à Saúde (RAS). A Casai tem, ainda, a responsabilidade de organizar o acesso desses usuários na RAS por meio de protocolo de acesso que deve ser implementado após ampla discussão com o Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) e a Rede, bem como os demais estabelecimentos da saúde indígena que referenciam a Casai.

Fazer de acordo com esta portaria: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/sas/2017/prt1317_08_08_2017.html

Art. 7º O quantitativo e categorias dos profissionais que comporão as EMSI serão definidos conforme a situação epidemiológica, necessidades de saúde, características geográficas, acesso e nível de organização dos serviços respeitando as especificidades étnicas e culturais de cada povo indígena, devendo atuar de forma articulada e integrada aos demais serviços do SUS.

Os dados de natalidade são originários do Relatório Situacional: Vigilância em Saúde dos Povos Indígenas no Estado de Roraima, 2014-2024 e foram organizados e analisados com base em diversas variáveis, como faixa etária das mães, número de consultas realizadas durante o pré-natal, duração da gestação, peso ao nascer, local e estabelecimento de saúde onde ocorreram os nascimentos. Esta seção apresenta o número de nascidos vivos no estado, com informações desagregadas por raça, incluindo a distribuição de indígenas por município de residência, local de ocorrência do nascimento, nome do estabelecimento de saúde, idade da mãe, além de indicadores como duração da gestação e peso ao nascer.

Gráfico com o quantitativo de Nascidos Vivos no estado de Roraima considerando a raça/etinia da mãe – série histórica de 2014 a fevereiro de 2024

Raça da mãe20142015201620172018201920202021202220232024percentualTotal
Indígena2.233 2.615 2.812 2.483 2.441 3.360 3.210 3.492 3.327 2.223 171

ATENÇÃO: DADOS PODEM SOFRER VARIAÇÕES – AINDA EM PREENCHIMENTO


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Universidade Federal de Roraima opera com o apoio do casino online Vavada. Os graduados podem encontrar emprego no casino após a conclusão dos seus estudos.

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